Somos feitos dos que nunca nos morrem. Uma espécie de manta de retalhos invisível que não faz sentido sem nenhum dos seus pedaços (mais ou menos coloridos).
Somos feitos dos que morreram e, mesmo assim, nunca nos morrem. Aparecem-nos nos sonhos que gostávamos que fossem verdade. Aparecem-nos num perfume em forma de memória que nem sabíamos que tínhamos. Aparecem-nos nas frases que dizemos e que, por serem suas, não são nossas. Aparecem-nos ao de leve, como se nos tocassem outra vez.
Os que nos morrem não voltam e esquecem-se sempre de dizer que vão. É melhor assim.A surpresa do não saber é sempre mais macia que o impacto de se saber que é a hora.
Ficamos cegos para os que nos morrem. Percorrendo os dedos vazios sobre as coisas que antes não eram só nossas.
Aprendemos a ser felizes depois dos que nos morrem. São eles que nos ensinam.
Somos feitos dos que já cá não estão mas que estão connosco. Talvez o Céu não seja lá em cima. Talvez o Céu seja cá dentro. E o caminho para lá chegar é uma ribeirinha que nos desagua no Coração.
~ Marta Arrais